CONVERSAS À MESA (TISCHREDEN) PT. 9/47 - DOS PECADOS


Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 11 de Fevereiro de 2019, Segunda Feira, 23h25

CCXLIV.
Nenhum dos Padres da Igreja mencionou o pecado original até que Agostinho veio e nos mostrou a diferença entre o pecado original e o atual; a saber que o pecado original é a cobiça, a luxúria e o desejo, que também é considerado a raiz e a causa do pecado atual; tal luxúria e desejo dos fiéis, Deus perdoa, não imputando a eles, por causa de Cristo, apesar de suas resistências pela assistência do Espírito Santo – Como S. Paulo em Romanos VIII. Os papistas e outros pecadores se opõem à verdade conhecida. São Paulo diz: “Ao homem herege, depois de uma e outra admoestação, evita-o. Sabendo que esse tal está pervertido, e peca, estando já em si mesmo condenado.”. E Cristo diz: “Deixai-os! Eles são guias cegos guiando cegos”. Se alguém errar por ignorância, será instruído; mas se este alguém se endurecer e não ceder à verdade, como foi com o Faraó que não reconheceu seus erros e nem se humilhou diante de Deus, e, portanto, foi destruído no Mar Vermelho, assim este alguém também será destruído. Somos todos pecadores por natureza – concebidos em pecado; o pecado nos envenenou completamente; carregamos de Adão uma vontade que se opõe à Deus, a menos que, pelo Espírito Santo, seja renovada e transformada. Disto nem os filósofos e nem os advogados sabem de nada; portanto, estão justamente excluídos do circuito da divindade, pois não fundamentam sua doutrina na Palavra de Deus.

CCXLV.
Os pecados contra o Espírito Santo são, primeiro, presunção; segundo, aflição; terceiro, oposição e condenação da verdade conhecida; quarto, não desejar o bem, mas ressentir o irmão ou o próximo da graça de Deus; quinto, ser endurecido; sexto, ser impenitente.

CCXLVI.
Os maiores pecados cometidos contra Deus são as violações da primeira Tábua da Lei. Nenhum homem entende ou sente esses pecados, somente aqueles que tem o Espírito Santo e a Graça de Deus. Portanto, as pessoas que possuem o Espírito Santo se sentem seguras, e, mesmo assim, podem atrair a ira de Deus. Ainda que se lisonjeiem, permanecem no favor de Deus. Sim, eles podem corromper a Palavra de Deus e condená-la; e ainda penso que eles fazem um serviço agradável e especial a Deus. Por exemplo: Paulo sustentou que a lei de Deus é o tesouro mais elevado e precioso da Terra, assim como nós tratamos os Evangelhos. Paulo arriscava seu próprio sangue para mantê-la; e ele não desejava entendimento, nem sabedoria, muito menos poder. Mas, antes que pudesse olhá-la corretamente, e enquanto ele procurava seu compromisso mais seguro, foi lhe apresentado uma outra lição. Paulo recebeu uma outra mensagem dizendo que todas as suas obras, ações, diligência e zelo eram totalmente contra a Deus. No entanto, seus feitos traziam um justo favor para os sábios e homens aparentemente santos, que diziam que Paulo tratava da retidão e realizava obras divinas e santas, mostrando tal zelo pela honra de Deus e pela lei.

Mas a voz de Deus atingiu o ouvido de Paulo que caiu por terra e ouviu: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” Ou seja, é como se Deus estivesse dizendo a ele: “Mesmo que tu pensas que estás fazendo meus serviços, na verdade, está me perseguindo, como se Eu fosse seu maior inimigo. É verdade que tu reconhece que tens a minha palavra, e que entendes a lei e a defendes; tu recebes autoridade dos anciãos e escribas, mas eles são cegos e tu continuas prosseguindo. Mas tu sabes que na minha lei ordeno que todo aquele que tomar o meu nome em vão, morrerá. Tu, Saulo, tomaste o meu nome em vão; portanto, tu és justamente punido.” Ao que Paulo disse: “Senhor, que queres que eu faça?” Estando marcado, este homem era um mestre na lei de Moisés, e ainda assim ele perguntou o que deveria fazer.

CCXLVII.
Nós carregamos muitos pecados contra o nosso Senhor Deus, e que justamente O tem desagradado – a raiva, a impaciência, a cobiça, a ganância, a incontinência, o ódio, a malícia, etc. Estes são grandes pecados que todo mundo carrega e, ainda por cima, leva vantagem. Contudo, tais pecados não são nada em comparação com a rejeição da Palavra de Deus; sim, todos nós permanecemos descompromissados. Mas, ai de mim! O mundo inteiro está afogado nestes pecados. Nenhum homem se importa com o evangelho, todos grunhem e perseguem o Evangelho como se não fosse nenhum pecado. Eu vejo com admiração na igreja que, entre os ouvintes, um aparenta ser dessa maneira e o outro de outra maneira; e que entre uma multidão tão grande, poucos se aproximam para ouvir o sermão. Tais pecados são tão comuns que as pessoas não confessam como outros pecados; cada um considera ouvir um discurso como algo tão pequeno, que acaba não refletindo em nada internamente. Não é assim quando é sobre outros pecados como o assassinato, o adultério, o roubo, etc. Pois, depois desses pecados, no devido tempo, seguem a tristeza, o sofrimento do coração, e o remorso. Mas não ouvir a Palavra de Deus com diligência, sim, rejeitando-a, perseguindo-a, o homem não mostra nenhuma consideração. No entanto, é um pecado tão assustador que, para cometê-lo, a terra e os homens precisam ser destruídos, assim como foi com Jerusalém, Roma, Grécia e outros reinos.

CCXLVIII.
Cristo bem sabia em discriminar os pecados; vemos no Evangelho o quão severo Ele era em relação aos fariseus devido ao ódio e inveja contra Ele e Sua Palavra, enquanto, pelo contrário, quão amável e amigável Ele era em relação à mulher que era pecadora. Essa mesma inveja necessitará roubar de Cristo a Sua Palavra, pois a inveja é um inimigo amargo para ela, e no final a crucificará. Mas a mulher, como a maior pecadora, toma posse da Palavra, ouve a Cristo e acredita que Ele é o único Salvador do mundo; ela lava os pés dEle e O unge com uma água caríssima.

CCXLIX.
Não podemos nos considerar mais justos do que o pobre pecador e assassino na cruz. Eu acredito que se os apóstolos não tivessem caído, eles não teriam acreditado na remissão dos pecados. Portanto, quando o diabo me joga na cara os meus pecados, então eu digo; Bom São Pedro, embora eu seja um grande pecador, ainda assim não neguei a Cristo meu Salvador, como você fez. Em tais casos, o perdão dos pecados permanece confirmado. E, embora os apóstolos fossem pecadores, ainda assim nosso Salvador Cristo sempre os dispensou, como quando eles arrancavam as espigas do milho; mas, ao contrário, Ele zombou dos fariseus que focavam no pagamento do tributo e, geralmente, mostrava sua desaprovação a eles; mas os discípulos Ele sempre os consolou, como Pedro, onde Ele diz: “Não temas, de agora em diante será pescador de homens”.

CCL.
Nenhum pecador pode escapar da punição, a menos que se arrependa de seus pecados. Pois, se alguém for libertado temporariamente, ainda sim ele será julgado, como diz o Salmo: “De fato, Deus ainda é juiz na terra”.

Nosso Senhor Deus faz com que os ímpios sejam surpreendidos e levados cativos por coisas muito leves e pequenas, quando não se preocupam, quando se sentem mais seguros, e vivem em deleite e prazer, pulando de alegria. De tal maneira quando o papa ficou surpreso comigo, com suas indulgências e indultos, comparativamente um assunto leve.

CCLI.
Um magistrado, um pai ou mãe, um senhor ou uma dama, um comerciante e um outro, devem, de vez em quando, olhar através dos dedos de suas crianças e servos, se os seus erros ou ofensas não foram muito graves e frequentes; para onde teremos summus jus, segue-se muitas vezes summa injuria, de modo que todos acabam que naufragando. Nem sempre os que estão no cargo elevado possuem sorte, pois erram e pecam, e devem, portanto, desejar o perdão dos pecados.

Deus perdoa os pecados pela graça do amor de Cristo; mas não devemos abusar da graça de Deus. Deus deu sinais suficientes para que os nossos pecados sejam perdoados; ou seja, a pregação do evangelho, o batismo, a Ceia do Senhor e o Espírito Santo em nossos corações.

Agora também é necessário testificar em nossas obras que recebemos o perdão dos pecados, cada um perdoando as falhas do seu irmão. Não há comparação entre a remissão dos pecados de Deus e o nosso. Pois o que são cem pences, em comparação com dez mil libras? Como Cristo diz, nada. E apesar de não merecermos nada pelo nosso perdão, ainda assim devemos perdoar para que possamos provar e dar testemunho de que nós, através de Deus, recebemos o perdão dos nossos pecados.

O perdão dos pecados é declarado apenas na Palavra de Deus, e devemos sempre buscá-lo; porque está fundamentada nas promessas de Deus. Deus perdoa os teus pecados, não porque você lamenta, mas sim este pecado produz em si, sem merecer, mas Ele perdoa seus pecados porque Ele é misericordioso, e porque Ele prometeu perdoar por amor a Cristo.

CCLII.
Quando Deus disse a Caim, através de Adão: “Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta”, Ele nos mostra a aparência do pecado, e fala com Caim como ele fosse o mais hipócrita; Era como Adão tivesse dito: O viste como foi comigo no Paraíso; Eu também teria, de bom grado, escondido a minha ofensa com folhas de figueira, espreitando por detrás de uma árvore, mas sei, bom companheiro, nosso Senhor Deus não será tão enganado; as folhas de figueira não serviriam de volta.

Ah! Era, sem dúvida, para Adão, uma tarefa dolorosa e de partir o coração, quando ele foi obrigado a banir seu filho primogênito, a expusá-lo de sua casa e dizer: Afasta de mim e não vem mais à minha vista; Ainda sinto o que já perdi no Paraíso, não perderei mais por tua causa; Eu vou agora, com mais diligência, dar atenção aos mandamentos de Deus. E, sem dúvida, Adão depois teve uma diligência redobrada.

CCLIII.
Esses dois pecados, ódio e orgulho, se amontoam e se desgastam, como o diabo se vestiu na Divindade. O ódio será divino; o orgulho será verdade. Esses dois são pecados mortais: o ódio mata, e o orgulho mente.

CCLIV.
Pode ser prejudicial para alguém que não reconhecer e confessar seus pecados. Fizestes este ou aquele pecado? Quais então? Nós somos livres, em Nome de Deus, para reconhecermos os nossos pecados, e não o negamos, mas com coração dizemos: Óh Senhor Deus! Eu fiz esse pecado.

Embora você não tenha cometido este ou aquele pecado, ainda assim, você é uma criatura ímpia; e se você não cometeu o mesmo pecado que o outro fez, lógicamente você não cometeu esse pecado; mas, portanto, deve chorar com ele. É como o dia em que um homem que vendia lobos jovens foi indagado a respeito de qual era o melhor dentre esses lobos. Então, ele veio com a resposta: Se um for bom, então todos são bons; eles são todos iguais. Ou seja, se você foi um assassino, um adúltero, um bêbado, etc., então eu também tenho sido um blasfemo de Deus que, pelo tempo de quinze anos, fui um frade e blasfemei contra Deus ao celebrar aquele ídolo abominável, a missa. Era melhor eu ter participado de outras perversidades; mas o que é feito não pode ser desfeito; mas aquele que roubou, então não roube mais daqui em diante.

CCLV.
Os pecados das pessoas comuns e sem instrução não são nada em comparação com o pecados cometidos por pessoas grandes e elevadas, que estão nos ofícios espirituais e temporais.

Quais são os pecados cometidos por um pobre coitado que, de acordo com a lei e a justiça, são enforcados, ou as ofensas de uma pobre prostituta, comparadas com os pecados de um falso mestre que diariamente mata muitas pessoas pobres de corpo e alma? Os pecados cometidos contra a primeira tábua dos dez mandamentos de Deus, não são tão considerados pelo mundo, como os pecados cometidos contra a segunda tábua.

CCLVI.
O pecado original, após a regeneração, é como uma ferida que começa a curar; embora seja uma ferida que passa por um período bem dolorido, ainda está em curso de cura.

Assim, o pecado original permanece nos cristãos até que eles morram, mas o pecado é mortificado e sempre está morrendo. Sua cabeça é esmagada em pedaços, para que nós não sejamos condenados.

CCLVII.
Todas as inclinações naturais não são de Deus ou são contra Ele; portanto, nenhuma inclinação é boa. Eu provo assim: todas as afeições, desejos e inclinações da humanidade são maus, perversos e deteriorado, como diz as Escrituras.

A experiência testifica isso; porque nenhum homem é tão virtuoso a ponto de casar-se com uma esposa, para depois ter filhos e, em seguida, amá-los e criá-los no temor do Senhor Deus.

Nenhum herói empreende grandes empreendimentos pelo bem comum, mas por ambição pelos quais ele é justamente condenado: daí deve ser necessário que tais desejos e inclinações naturais originais sejam iníquos. Mas Deus carrega com eles e os deixa passar naqueles que crêem em Cristo.

CCLVIII.
Schenck prossegue da maneira mais monstruosa, discursando, sem o menor discernimento, sobre o assunto do pecado. Eu mesmo o ouvi dizer, no púlpito de Eisenach, sem nenhuma qualificação: “Pecado, o pecado não é nada; Deus receberá pecadores; Ele mesmo nos diz que eles entrarão no reino dos céus”. Schenck não faz distinção entre pecados que foram praticados, pecados que estão sendo praticados e pecados que ainda serão praticados, de modo que quando as pessoas comuns o escutam dizer: “Pecado, porque Deus receberá pecadores”; eles prontamente repetem: “Bem, pecaremos então”. Essa é uma doutrina muito errônea. O que é anunciado quanto ao recebimento de pecadores por Deus aplica-se aos pecadores que se arrependeram; há toda a diferença no mundo entre o agnitum peccatum, assistido pelo arrependimento, e o velle peccare, que é uma inspiração do diabo.

 

Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira

 


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