Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 28 de Janeiro de 2023, Sábado, 16h28
DXXV.
Não pretendo criticar muito de perto os escritos dos Padres, visto que eles são recebidos na igreja e recebe grandes aplausos, caso eu criticá-los muito então eu seria considerado um apóstata; mas quem ler Crisóstomo descobrirá que ele se desvia dos pontos principais e prossegue com outro assunto dizendo quase nada sobre afazeres. Quando eu estava explicando a Epístola aos Hebreus e observei o que Crisóstomo havia escrito sobre ela, não encontrei nada que explique o propósito da epístola; por outro lado, acredito que naquela época, como principal retórico, Crisóstomo tinha muitos ouvintes e ensinava sem nada em troca; pois o principal objetivo de um pregador é ensinar com retidão e observar diligentemente os principais pontos e fundamentos em que ele se posiciona, e assim instruir os ouvintes para que eles entendam exatamente o que está sendo dito. Quando o ensino é bem feito, ele pode valer-se da retórica para adornar seu assunto e admoestar o povo.
DXXVI.
Veja que há uma grande escuridão nos livros dos Padres com relação à fé; visto que se o artigo da justificação não for muito bem claro, então é impossível sufocar os erros mais grosseiros da humanidade. São Jerônimo chegou a escrever sobre Mateus, sobre as epístolas de Gálatas e de Tito; mas foi muito infeliz e frio. Ambrósio escreveu seis livros sobre o primeiro livro de Moisés, mas não há riqueza nos assuntos. Agostinho não escreveu nada a respeito da fé; pois ele foi o primeiro despertado e feito homem pelos pelagianos, e passou a lutar contra eles. Não consigo encontrar nenhuma explicação sobre as epístolas aos romanos e aos gálatas de uma maneira mais pura e correta. Oh, que tempo feliz temos agora em relação à pureza da doutrina; mas, infelizmente pouco a estimamos. Depois dos Padres veio o papa com suas tradições maldosas e ordenanças humanas como águas do dilúvio transbordando toda a igreja, enlaçando consciências em relação aos costumes, frades com capuzes, missas, etc.; ele traz erros abomináveis para a igreja de Cristo constantemente; e para cumprir as suas mudanças, se apega à sentença de Santo Agostinho onde diz: Evangelio no crederen, etc. Esses burros não foram capazes de ver o que levou Agostinho a proferir essa frase, considerando que ele estava falando contra os maniqueístas dizendo: Eu não acredito em vocês, pois vocês são malditos hereges, mas eu acredito na Igreja, a esposa de Cristo, que não pode errar.
DXXVII.
Epifânio compilou uma história da igreja muito antes de Jerônimo; seus escritos são bons e proveitosos, seus argumentos são separados de argumentos desregrados, vale a pena a impressão.
DXXVIII.
Eu amo os escritos de Prudêncio; ele foi o melhor entre os poetas cristãos; se tivesse vivido nos tempos de Virgílo, teria sido exaltado acima de Horácio. Eu gostaria que os versos de Prudêncio fossem lidos nas escolas, mas as escolas agora são pagãs e a Sagrada Escritura foi banida e sofisticada através da filosofia.
DXXIX.
Devemos ler os Padres com cautela e colocá-los em uma balança de ouro, pois eles frequentemente se desviam misturando em seus livros muitas coisas monásticas. Agostinho teve mais trabalho, pois ele teve que lidar com os hereges. Gregório explica as cinco libras mencionadas no Evangelho onde o lavrador deu aos seus servos para usarem, as cinco libras representam os cinco sentidos. As duas libras, ele interpreta como a razão e o entendimento.
DXXX.
Quanto mais leio os livros dos Padres, mais me sinto ofendido; pois eles eram apenas homens e, com toda sua reputação e autoridade, subestimaram os escritos dos Sagrados Apóstolos de Cristo. Os papistas não tem vergonha de dizer: O que é a Escritura? Devemos é ler os Santos Padres e mestres, pois eles extraíram todo o mel da Escritura. Como se a Palavra de Deus não precisasse mais ser compreendida, enquanto que o Pai Celestial diz: “A Ele ouvireis em tudo quanto vos disser”, que no evangelho ensinou mais claramente com parábolas e semelhanças.
DXXXI.
Agostinho foi o mais capaz de todos os doutores, mas ele não podia por si só trazer as coisas de volta à sua condição original, e ele frequentemente denunciava os bispos que perturbavam a igreja com suas tradições e ordenanças mais do que os judeus com suas leis.
DXXXII.
Os cristãos fieis devem prestar atenção apenas à embaixada de nosso abençoado Salvador Cristo e ao que ele diz. Todo aquele que interpreta o Evangelho por meio da autoridade, poder e reputação humana age de uma maneira anticristã e contra Deus. Nenhum potentado temporal permite que seu embaixador exceda suas instruções, nem uma palavra a mais; contudo, nós, nessa embaixada celestial e divina, seremos tão presunçosos a ponto de acrescentar e diminuir as nossas instruções celestiais, de acordo com a nossa própria presunção e vontade.
DXXXIII.
Tenho plena convicção de que se São Pedro em pessoa pregasse as Sagradas Escrituras e negasse a autoridade papal, e dissesse que o papa não é o cabeça de toda a Cristandade, eles simplesmente mandariam São Pedro para a forca. Sim! Tenho plena convicção de que se o próprio Cristo retornasse e pregasse as Sagradas Escrituras, sem dúvida o papa O crucificaria novamente. Portanto, estejamos preparados para o mesmo tratamento; mas é melhor sermos edificados sobre Cristo do que sobre o papa. Se, de coração, eu não acreditasse na vida após a morte, então eu cantaria uma outra canção o colocaria esse fardo no pescoço de outra pessoa.
DXXXIV.
Os Comentários de Lyra sobre a Bíblia são dignos de todo louvor. Ordenarei que sejam lidos diligentemente, pois realmente são muito bons, especialmente na parte histórica do Antigo Testamento. Lyra é muito proveitosa para aqueles que são bem versados no Novo Testamento. Já os comentários de Paulus e Simigerus são muito frios; eles podem muito bem ser deixados de lado se caso os comentários de Lyra forem impressos.
DXXXV.
Jerônimo não deveria ser contado entre os mestres da igreja, pois ele era um herege; mas creio que ele foi salvo pela fé em Cristo. Ele não fala de Cristo, apenas carrega seu nome na boca.
DXXXVI.
Os Terministas, entre os quais eu era, são sectários nas escolas secundárias; eles se opõem aos Tomistas, aos Escotitas e aos Albertistas; eles também são chamados de Occamistas devido ao Occam, seu fundador. Eles são seitas mais novas e mais fracas em Paris.
A questão discutida entre eles era se a palavra humanitas estava relacionada a humanidade em geral, residindo em cada criatura humana, como Thomas e outros assim defendem. Os Occamistas e Terministas alegam que não é um termo geral, mas sim é um termo particular de toda criatura humana; como a imagem de uma criatura humana representasse toda a criatura humana.
Eles são chamados de Terministas porque eles falam de coisas em suas próprias palavras, mas não as aplicam com renovações. Como um carpinteiro que fala tecnicamente de acordo com a sua profissão, como se estivesse usando um cinzel ou um machado. Mesmo assim devemos manter as Palavras de Cristo e falar dos sacramentos in suis terminis de acordo com o que Cristo disse: “Faça isso” para não ser transformada em “Ofereça isso”; e a palavra corpus não deve significar ambos os tipos, visto que os papistas rasgam as palavras e deliberadamente as distorcem saindo do seu contexto.
DXXXVII.
O mestre das sentenças, Peter Lombard, era um homem muito cuidadoso e de grande compreensão; ele escreveu muitas coisas com excelência. Se ele tivesse se entregado totalmente às Sagradas Escrituras, ele seria de fato um grande doutor da igreja; mas ele introduziu questões inúteis em seus livros, sofisticando e misturando tudo junto. Os teólogos da escola eram inteligentes e delicados, mas não viviam nos tempos como nós. Eles chegaram tão longe com ensinamentos de que a humanidade não estava completa ou pura, mas ferida em partes; eles também ensinavam que as pessoas com o seu próprio poder poderiam cumprir a lei, mesmo sem a Graça; mas quando alcançavam a graça, pudiam mais facilmente cumprir a lei através de seu próprio poder.
São tantas coisas horríveis da vida que eles ensinaram; mas eles não viram e muito menos sentiram a queda de Adão, nem mesmo a espiritualidade da lei de Deus onde exige uma obediência particular e pública, tanto no corpo quanto na alma.
DXXXVIII.
Gabriel Biel escreveu um livro sobre o cânone na missa, que na época eu considerava o melhor; meu coração chegava a sangrar quando lia. Ainda guardo aquele livro que tanto me atormentava. Scotus escreveu muito bem sobre o Magister sententiarum, e diligentemente tentou ensinar sobre esses assuntos. Occam era um homem capaz e sensato.
Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira