CONVERSAS À MESA (TISCHREDEN) PT. 44/47 - DOS JUDEUS

Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 25 de Fevereiro de 2023, Sábado, 14h25

DCCCVII.
Os judeus se vangloriam por serem filhos de Abraão. De fato, é uma honra muito grande para eles, principalmente na questão do rico glutão clamar pelo “Pai Abraão” no inferno, etc. Mas nosso Senhor Deus sabe muito bem distinguir esses filhos; pois como foi com o rico glutão Ele fornece os benefícios aqui nesta vida, mas a recompensa para os outros Ele reserva para a vida futura.

DCCCVIII.
Os judeus são o povo mais miserável da terra. Eles são atormentados em toda parte e espalhados por todos os países, sem ter um lugar fixo para poder descansar. Eles são carregados nesses carinhos de mão, sem país, povo ou governo. E mesmo assim eles vivem na esperança, se animando e dizendo: Em breve estaremos bem. Mas eles são endurecidos, então deixe-os saber que não há outro Senhor ou Deus, mas somente aquele que já está sentado à direita de Deus Pai. Os judeus não possuem permissão para negociar ou manter um gado, pois eles são apenas usurários e corretores. Eles não comem nada que os cristãos matam ou tocam. Eles não bebem vinho, além de possuir muitas superstições. Eles lavam as mãos com mais diligência, considerando que eles não podem ser purificados pela carne. Eles não bebem leite porque Deus disse: “Não cozerás o cabrito no leite de sua mãe.” Tais superstições procedem da ira de Deus. Aqueles que não possuem fé vivem somente nas leis, como vemos nos papistas e nos turcos; mas os judeus são bem servidos, pois recusaram Cristo e seu Evangelho. Então em vez da liberdade, terão a servidão.

Se eu fosse judeu, o papa nunca iria me persuadir de sua doutrina. Eu preferiria ser torturado dez vezes. O papado com suas abominações e palavrões, deu aos judeus uma ofensa infinita. Estou convencido de que se os judeus ouvissem a nossa pregação e como lidamos com o Antigo Testamento, muitos deles iriam nos aceitar. Mas, por meio de debates, eles se tornaram cada vez mais teimosos, arrogantes e presunçosos. No entanto, se alguns rabinos caíssem, poderíamos ganhá-los, um após o outro, pois já estão quase cansados de esperar pela promessa.

DCCCIX.
Há muitos judeus em Frankfurt. Eles possuem uma rua inteira só para eles, onde todas as casas estão cheias deles. Eles são obrigados a usar pequenos anéis em seus casacos para serem reconhecidos. Eles não possuem casas ou terrenos próprios, apenas mobílias. Além de só poderem emprestar dinheiro em casas ou terrenos de grande risco.

DCCCX.
Eu estudei as principais passagens das Escrituras que constituem as bases sobre as quais os judeus argumentam contra nós; como onde Deus disse a Abraão: “Farei minha aliança entre mim e ti, e através da tua semente, em suas gerações, porei uma aliança eterna.”, etc. Aqui os judeus se vangloriam como fazem os papistas na passagem: “Tu és Pedro”. De bom grado eu privaria os judeus dessa vangloria, rejeitando a lei de Moisés, para que eles não pudessem me contradizer. Temos contra eles o profeta Jeremias onde diz: “Eis que vem o tempo, diz o Senhor, em que farei uma nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá, não como a aliança que fiz com seus pais.”, etc. “Mas esta será a aliança que farei com a casa de Israel; depois deste tempo, diz o Senhor, darei minhas leis em seus corações e as escreverei em suas mentes.”, etc.

Até neste ponto, os judeus devem ceder dizendo: a lei de Moisés continuou, mas por algum tempo. Portanto deve ser abolida. Entretanto, a aliança da circuncisão que foi dada antes do tempo de Moisés, feita entre Deus e Abraão, e também de sua semente Isaque e geração posterior, dizem eles, é uma aliança eterna que não é permitida que seja tirada.

E embora Moisés rejeite a circuncisão da carne e insista na circuncisão do coração, ainda assim, eles se vangloriam dessa aliança eterna da Palavra de Deus. E quando eles admitem que a circuncisão não justifica, ainda assim, eles dizem que é uma aliança eterna achando que é um pacto de obras. Então devemos deixar para eles sua circuncisão.

De mina parte, ao lado de todos os cristãos tementes a Deus, tenho esse forte consolo de que a circuncisão deveria continuar por algum tempo, até que o Messias viesse. Quando ele veio, o mandamento estava no fim. Moisés era sábio, pois se manteve dentro dos limites. Em todos os seus quatro livros após o Gênesis, ele não escreveu nada sobre a circuncisão física, mas apenas a circuncisão do coração. Ele fala sobre os sacrifícios, sobre o sábado e os pães da proposição; e deixou a circuncisão completamente de fora, não fazendo nenhuma menção a ela. É como diz: É pouco para ser considerado. Se tivesse sido de tanta importância para os judeus, ele sem dúvida mencionaria de acordo. Novamente, no Livro de Josué, é feita menção à circuncisão do coração. Os papistas cegos que nada sabem das Escrituras, não foram capazes de refutar um argumento dos judeus. Eles possuem uma cegueira terrível.

DCCCXI.
O versículo do Salmo 115 é magistral: “Ele abençoará os que temem ao Senhor, tanto grandes como pequenos.” Aqui o Espírito Santo é um forte trovão contra os orgulhosos e jactanciosos judeus e papistas que se vangloriam achando que somente eles são o povo de Deus, e não permitirão nada além daqueles que pertencem a sua igreja. Mas o Espírito Santo diz: Os pobres condenados também são povo de Deus, pois Deus salvou muitos dos gentios sem precisar da lei ou circuncisão, como também sem o papado.

Os judeus não veem que Abraão foi declarado justificado somente pela fé. Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça. Deus com a circuncisão confirmou sua aliança com esta nação, mas apenas por um certo tempo. É verdade que a circuncisão dos judeus, antes da vinda de Cristo, teve uma grande majestade. O problema é que eles afirmam que sem a circuncisão ninguém pode ser considerado como pertencente do povo de Deus, e essa teoria é insustentável. Os próprios judeus, em sua circuncisão, foram rejeitados por Deus.

DCCCXII.
Cristo expulsou os comerciantes do Templo não por qualquer autoridade temporal, mas pela jurisdição e poder da igreja. Autoridade essa que todo Sumo Sacerdote do Templo tinha. A glória deste Templo era grande e o mundo inteiro deveria adorar a Deus ali. Mas Deus, pela sua infinita sabedoria, fez com que este Templo fosse destruído para que os judeus possam ser confundidos e não mais se vangloriar por tais tradições.

DCCCXIII.
Não há sombra de dúvidas de que muitos judeus se refugiaram para a Itália e para a Alemanha antigamente, e lá se estabeleceram.

Cícero, o gentio eloquente, criticou as superstições dos judeus na Itália. E nós encontramos suas pegadas por toda a parte da Alemanha. Aqui, na Saxônia, muitos nomes de lugares mencionam eles: Ziman, Damen, Resen, Sygretz, Schvitz, Pratha, Thablon. Os judeus habitaram Ratisbona muito antes de Cristo nascer. Em Cremona existem apenas vinte e oito cristãos. Era uma nação poderosa.

DCCCXIV.
Os judeus leem nossos livros e levantam objeções contra nós. É uma nação que despreza e blasfema, assim como fazem os advogados, os papistas e os adversários, tirando de nossos escritos o conhecimento de nossa causa e usando-os como armas contra nós. Mas, Deus seja louvado, pois nossa causa tem um fundamento seguro, a saber, Deus e sua Palavra.

DCCCXV.
Dois rabinos judeus, Schamaria e Jacob, me visitaram em Wittenberg, desejando-me cartas de salvo-conduto que lhes concedi, e eles ficaram muito satisfeitos; somente eles me imploraram na sinceridade para omitir a palavra Tola, isto é, Jesus crucificado. Pois eles parecem possuir uma necessidade de blasfemar contra o nome de Jesus. Eles disseram: “É maravilhoso que tantas pessoas inocentes foram massacradas, e nenhuma menção a elas é feita, enquanto esse Jesus, o crucificado, sempre deve ser lembrado.”

DCCCXVI.
Os judeus devem ser confrontados com fortes argumentos, como quando Jeremias fala a respeito de Cristo: “Eis que vem dias, diz o Senhor, em que farei surgir a Davi um ramo justo, e um rei reinará e prosperará, e executará juízo e justiça na terra; em seus dias Judá será salvo, e Israel terá segurança, e este é o seu nome pelo qual será chamado: O SENHOR É A NOSSA JUSTIÇA”. Este argumento os judeus não são capazes de resolver. No entanto, se eles negam que essa sentença é sobre Cristo, então eles nos devem mostrar outro rei, descendente de Davi, que governará enquanto o sol e a lua durarem, como declaram os profetas.

DCCCXVII.
Ou Deus deve ser injusto, ou vocês, judeus, são perversos e ímpios. Pois vocês estiveram na miséria e no terrível exílio por muito mais tempo do que quando estiveram na terra de Canaã. Vocês não mantiveram o Templo de Salomão por mais de trezentos anos, e foram caçados por cima e por baixo por mais de mil e quinhentos anos. Na Babilônia vocês tiveram mais eminência do que em Jerusalém, pois Daniel era um príncipe maior e mais poderoso na Babilônia do que Davi ou Salomão em Jerusalém. O cativeiro babilônico foi para vocês apenas uma vara paternal, mas esta última punição foi o seu extermínio total. Vocês têm sido uma raça rejeitada por Deus por mais de mil anos, sem governo, sem leis, sem profetas, sem templo. Este argumento vocês não conseguem resolver; atingem vocês no chão como um trovão. Vocês não conseguem mostrar uma outra razão para sua condição do que seus pecados. Os dois rabinos, tocados no coração, silenciados e convencidos, abandonaram seus erros, converteram-se e, no dia seguinte, na presença de toda a universidade de Wittenberg, foram batizados cristãos.

Os judeus esperam que os juntemos a eles porque ensinamos e aprendemos a língua hebraica, mas suas esperanças são vãs. Eles precisam aceitar a nossa religião, o Cristo crucificado, e superar todas as suas objeções, especialmente da alteração do sábado que os aborrece profundamente, mas foi ordenado pelos apóstolos em honra da ressurreição do Senhor.

DCCCXVIII.
Há feiticeiros entre os judeus que se deleitam em atormentar os cristãos, pois eles nos tratam como cães. O duque Alberto da Saxônia puniu bem um desses miseráveis. Um judeu ofereceu-se para vender-lhe um talismã coberto com caracteres estranhos, que diz proteger o usuário contra qualquer golpe de espada ou adaga. O duque respondeu: “Vou testar esse encanto sobre você mesmo, judeu.” Então o duque colocou o talismã no pescoço do judeu, desembainhou sua espada e atravessou seu corpo. “Tu sentes, judeu!” disse ele, “como teria sido comigo se eu tivesse comprado seu talismã?”

DCCCXIX.
Os judeus possuem várias histórias sobre um rei de Bassan, a quem os chamam de Og. Dizem que ele levantou uma grande pedra para atirar em seus inimigos, mas Deus fez um buraco no meio da pedra, de modo que escorregasse sobre o pescoço do gigante e não conseguisse escapar. É uma fábula como o resto das histórias sobre ele, mas, talvez, carrega uma moral oculta como as fábulas de Esopo, pois os judeus tinham alguns homens muito sábios entre eles.

DCCCXX.
A destruição de Jerusalém foi terrível. O destino de todos os governos de Sodoma, de Gomorra, do Faraó, da Babilônia, não era nada comparado ao que Jerusalém passou. Visto que essa cidade tinha sido a habitação de Deus, seu jardim, sua cama. Como diz no Salmo: “Aqui habitarei porque a escolhi”, etc. Havia lei, sacerdócio, templo e, também, foi ali onde floresceram Davi, Salomão, Isaías, etc.; Muitos profetas foram enterrados lá, e os judeus tinham seus motivos de se gabarem desses privilégios. O que somos nós além de pobres e miseráveis – o que é Roma comparada com Jerusalém? Mas os judeus estão tão endurecidos que não ouvem nada, embora sejam vencidos pelos testemunhos, mas não cedem uma polegada. É uma raça perniciosa, oprimindo todos os homens com sua usura e rapina. Se derem a um príncipe ou a um magistrado mil florins, eles acabam exortando vinte mil dos súditos por meio do pagamento. Devemos nos manter em guarda contra eles. Eles acham que rendem homenagens a Deus ferindo os cristãos, e ainda assim empregamos seus médicos. Estão tentando contra Deus. Eles possuem orações altivas que louvam e invocam a Deus, como se fosse o único povo de Deus amaldiçoando e condenando todas as outras nações. Eles confiam no Salmo 23: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará”, como se esse salmo tivesse escrito exclusivamente para eles.

DCCCXXI.
É uma espécie de vanglória que os judeus fazem com seus privilégios após um lapso de mais de mil e quinhentos anos. Durante setenta anos, eles foram cativos na Babilônia ficando meio confusos e misturados a ponto de não saber direito de qual tribo cada um descendia. Os judeus foram caçados por tanto tempo pelos gentios, cujos soldados não pouparam nem as esposas e filhos, de modo que eles agora são um povo órfão e bastardo, pois agora nenhum deles sabe de qual tribo eles são. Em 1537, quando eu estava em Frankfurt, um grande rabino me disse: Meu pai tinha lido muito as Escrituras e esperado ansiosamente pela vinda do Messias, mas ele enfraqueceu sua esperança dizendo: Como nosso Messias não veio em mil e quinhentos anos, certamente deve ser Cristo Jesus.

DCCCXXII.
Os judeus tinham grandes privilégios acima de todas as outras nações. Eles tinham as principais promessas, a mais alta adoração a Deus, e uma adoração mais agradável à natureza humana do que o serviço de fé de Deus no Novo Testamento. Eles concordam melhor com os turcos do que com os cristãos, pois judeus e turcos concordam que há apenas um só Deus, e não reconhecem que há três pessoas em uma só substância divina. Eles também concordam quanto ao banho e higienização, circuncisão e entre outras cerimônias aparentes.

Os judeus tinham homens excelentes entre eles como Abraão, Isaque, Jacó, Moisés, Davi, Daniel, Samuel, Paulo, etc. Quem poderia senão lamentar que uma nação tão grandiosa seja miseravelmente destruída? A igreja latina não teve homens e nem professores excelentes como Agostinho. E as igrejas do leste ninguém menos que Atanásio, e ele não tinha nada de particular. Então somos como galhos enxertados na árvore certa. Os profetas chamam os judeus, especialmente os da linhagem de Abraão, como uma mudança justa da qual o próprio Cristo veio.

DCCCXXIII.
No pórtico de uma igreja na Colônia há uma estátua de um reitor segurando em uma das mãos um gato e na outra, um rato. Este reitor era judeu que foi batizado e tornou-se cristão. Ele tinha ordenado que sua estátua fosse erguida logo após a sua morte para mostrar que um judeu e um cristão concordam tão pouco quanto um gato e um rato. E, verdadeiramente, os judeus odeiam os cristãos da mesma maneira que odeiam a morte. Eles se irritam apenas em nos ver. Se eu fosse um senhor feudal, não permitiria que praticassem tais usuras.

DCCCXXIV.
Os judeus sabiam perfeitamente que o Messias estava por vir e que deveriam segui-lo, mas não foram convencidos que o nosso Jesus era o Messias. Eles achavam que o Messias restauraria todas as coisas como eram antes, mas como eles viram que Cristo tomo um caminho contrária às suas expectativas, eles o crucificaram. Ainda assim, eles se gabam de serem o único povo de Deus.

DCCCXXV.
Um judeu veio até a mim em Wittenberg e disse que desejava ser batizado como cristão, mas primeiro queria ir a Roma para ver o chefe da cristandade. A partir dessa questão, eu, Philip Melancthon e outros teólogos trabalhamos para dissuadi-lo, pois estávamos temendo que, ao testemunhar as fraudes em Roma, ele passasse a ter medo da cristandade. Mas o judeu foi a Roma mesmo assim e quando viu as abominações praticadas lá, voltou até a nós desejando ser batizado e disse: “Agora adorarei de bom grado o Deus dos cristãos, pois ele é um Deus paciente. Se ele pode suportar tamanha maldade como eu vi em Roma, então ele pode tolerar todos os vícios e patifarias do mundo.”

 

Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira


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