Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 18 de Janeiro de 2023, Quarta Feira, 18h39
CCCLXXX.
Os ímpios possuem grande poder, riqueza e respeito; ao contrário de nós, cristãos justos e verdadeiros, que temos apenas um Cristo pobre e desprezado. Coisas temporais, dinheiro, riqueza, reputação e poder eles já possuem, então eles não se importam com Cristo. Nós dizemos a eles: Vós sois grandes senhores na terra, e nós somos senhores no céu; vós tendes o poder e as riquezas na terra, e nós temos o tesouro celestial, isto é, a Palavra e o Mandamento de Deus; nós também temos o batismo e os sacramentos da Ceia do Senhor, e se algum homem entre nós for injusto, insolente e maldoso, então este homem será excomungado para que não esteja presente no batismo, nem na sagrada comunhão e nem em reuniões com outros cristãos. Mas se ele abandona por conta própria a cristandade nele, então ele desiste do seu chamado e estamos dispostos a sofrer com paciência a sua tirania e insolência; ficamos contentes em deixá-lo ir como os pagãos, judeus e turcos, e assim entregar nossa causa a Deus.
CCCLXXXI.
Nossa ação contra o papa resulta na total excomunhão que é simplesmente a declaração pública de que uma pessoa é desobediente à Palavra de Cristo. Agora afirmamos em público que o papa e sua comitiva não acreditam; portanto, concluímos que ele será condenado. O que seria isso senão excomungá-lo? Resumidamente colocar a Palavra de Cristo em execução e cumprir o seu comando, isso é excomunhão.
CCCLXXXII.
Procederei com a excomunhão desta maneira primeiro, quando eu advertir um pecador obstinado enviarei a ele duas pessoas, capelães ou vereadores, guardas da igreja ou homens honestos da assembleia; se caso ele não for reformado e ainda continuar na teimosia persistindo na vida pecaminosa, então eu o declararei abertamente à igreja assim: Amados amigos, declaro que fulano de tal foi advertido primeiro por mim em particular, depois por dois capelães; em terceiro lugar, por dois vereadores ou guardas da igreja, conforme possa ser e mesmo assim não abandonou sua vida pecaminosa; portanto, desejo sinceramente a todos vocês para ajoelhar junto comigo e orar contra ele para entregá-lo ao diabo, etc.
Por meio disso, devemos, sem dúvida, prevalecer até agora, para que as pessoas não se entreguem ao pecado causando vergonha em público; para isso seria uma excomunhão estrita, estando longe de ser como os touros de dinheiro do papa que são lucrativos para a igreja. Se caso a pessoa se converter e voltar a ser reformada, então a receberemos de volta no seio da igreja.
CCCLXXXIII.
Cristo fará com que um pecador seja primeiro advertido e admoestado, não apenas por uma ou duas vezes por pessoas simples ou privadas que não estão no cargo, mas também por aqueles que estão no cargo de pregação pública, antes que a severa sentença de excomunhão seja abertamente declarada. Mas enquanto o ministério da Palavra chama para a Ceia do Senhor todos os fiéis que se arrependem de seus pecados e os admitem no seio da igreja de Cristo, então deve justamente rejeitar os impenitentes endurecidos e abandoná-los aos julgamentos de Deus, excluindo-os da sociedade cristã e, caso venham a falecer em seus pecados, que não participem do enterro cristão.
CCCLXXXIV.
Nada impediria mais a excomunhão do que para os homens fazerem o que pertence a um cristão. Você conhece a vida de seu vizinho, mas seu pregador ou ministro a desconhece: Quando você descobrir que esse vizinho está enriquecendo por meio de transações ilícitas, vivendo lascivamente, em adultério, etc.; que ele governa sua casa e família com negligência, etc.; então você deve, como cristão, admoestá-lo a abandonar de seus caminhos pecaminosos e a cuidar de sua salvação. Oh, quão santa seria a obra que você realizaria se dessa maneira ganhasse o seu próximo! Mas eu suplico, quem faz isso? Pois, primeiro, a verdade é algo odioso; aquele que fala a verdade provoca o ódio. Portanto, tenho certeza que você prefere manter a amizade e a boa vontade de seu próximo, especialmente quando ele é rico e poderoso, mantendo sua paz e silêncio, do que incorrer em seu desagrado e torná-lo seu adversário.
Novamente temos menos excomunhão agora, apesar de estarmos todos sujeitos a blasfêmia, e com isso ficamos manchados; de modo que temos medo de arrancar o cisco que vemos no olho do próximo para não sermos atingidos nos dentes pela trave que aparece no nosso.
Mas a principal causa pela qual a excomunhão diminuiu é devido ao número pequeno de cristãos justos e verdadeiros em todos os lugares; pois, se de coração amamos e praticamos a verdadeira e reta piedade e a Palavra de Deus, como todos devemos amar e praticar, então devemos considerar o mandamento de Cristo, nosso bendito Salvador, acima de tudo, riqueza, bem-estar ou favor para esta vida temporal. Pois este mandamento de Cristo que diz a respeito de admoestar um irmão pecador, é tão necessário quanto este: “Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás…”, visto que quando, por medo ou por algum outro respeito mundano, você omite esta advertência, então depende não o corpo e os bens de seu próximo, mas a salvação da sua alma.
CCCLXXXV.
Tome cuidado se caso você não condenar a comunhão da verdadeira igreja; um desprezo certeiro envolvendo o desagrado de Deus; pois Cristo diz: “Em verdade vos digo que o que ligardes na terra também será ligado no céu”, etc. O papa, com a sua tirania, abusa desse poder da excomunhão. Se um homem pobre não puder pagar o imposto que o papa lhe impõe em um determinado dia, ele é excomungado; e assim, da mesma forma, ele troveja seus touros de excomunhões contra nós porque simplesmente confessamos a doutrina salvadora do Evangelho; ainda assim, nosso Salvador Cristo nos conforta dizendo: “Felizes sois vós quando os homens vos injuriarem e perseguirem por minha causa, e falarem todo tipo de mal contra vós”, etc. “Eles irão excomungá-lo ou lança-lo fora da sinagoga.”
Certamente a bula papal não é a excomunhão de Cristo porque não é feita de acordo com a instituição de Cristo; não tem valor no céu, mas sim para aquele que abusa contra o mandamento de Cristo, que traz a mais segura e certa destruição, pois é um pecado com o qual o nome de Deus é blasfemado.
CCCLXXXVI.
Assim como a excomunhão pública é usada apenas contra aqueles que pecaram publicamente, assim também é a excomunhão privada que não é dos homens ou feita por eles, mas do próprio Deus e feita somente por Ele. Sendo assim, muitas pessoas que consideramos cristãs aparentemente justas acabam sendo excluídas do Reino dos Céus. Pois Deus não julga somente pelas obras realizadas publicamente, mas sim também o coração; Ele conhece perfeitamente aquele hipócrita que a igreja não conhece, não pode julgar e nem punir; a igreja não julga o que está no oculto.
Nem todos estão manchados tão grosseiramente com ofensas que possamos prová-los em público, como seria apropriado com qualquer pecado em particular. Pois embora muitos avarentos, adúlteros, etc. estejam entre nós, eles avançam com tanta astúcia com seus pecados que não podemos identificá-los. No entanto, embora tais pessoas estejam conosco na igreja participando dos sacramentos, ouvindo os sermões e a Palavra de Deus, ainda assim estão excomungados por Deus porque vivem no pecado contra suas próprias consciências, e não desejam consertar suas vidas. Esses pecadores podem enganar os homens e a própria igreja, mas não podem enganar a Deus; Ele, no dia do juízo final, fará com que os seus anjos reúnam todos esses ofensores e os lançarão para o fogo eterno.
CCCLXXXVII.
Cristo diz: “Recebei o Espírito Santo, a quem perdoardes os pecados, eles são perdoados; e todos os pecados que retiverdes, eles serão retidos”. E “Se teu irmão pecar contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele sozinho; se ele te ouvir, ganhaste teu irmão. Mas se ele não te ouvir, então leva contigo um ou dois mais”, etc.; E disse mais “Se ele se recusar a ouvi-los, diga-o à igreja. Mas, se ele recusar a ouvir a igreja, considere-o gentio e publicano”. E São Paulo diz: “Se algum homem chamado de irmão for fornicador, ou avarento, ou idólatra, ou injuriador, ou beberrão, ou extorsor, não coma com ele, etc.; afaste-se daquela pessoa perversa.” E também: “Se alguém vier a você e não trouxer esta doutrina, não o receba em sua casa, nem o saudeis; porque aquele que lhe fornece saudações é participante de suas más ações.”
Essas e outras sentenças semelhantes são da vontade, dos decretos e das ordenanças da Alta Majestade de Deus; não temos direito em alterá-los ou omiti-los, muito menos em aboli-los; mas, pelo contrário, devemos ser sinceros com a verdadeira diligência para mantê-los, não dependendo de nenhum poder ou reputação de qualquer pessoa. Embora a excomunhão papal é vergonhosa e cheia de abusos, não devemos permitir que ela se rebaixe, mas façamos o uso correto dela como Cristo ordenou para a manutenção e progresso da igreja, não para exercer tirania como faz o papa.
Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira